Dentro do “pacote” de reforma tributária do Estado de Mato Grosso, o Poder Executivo Estadual encaminhou à Assembleia Legislativa o Projeto de Lei que trata sobre o PROCESSO ADMINISTRATIVO TRIBUTÁRIO.
Pois bem, não menos importante, tal questão de fato merece atenção de todos os contribuintes, posto que eventuais “erros” cometidos pelo Poder Público no tocante a exigência tributária pode ser sanada perante a própria administração fiscal, minimizando sobremaneira o ônus financeiro, seja para o contribuinte, como também para o próprio Erário conforme verificar-se-á a seguir.
Preliminarmente, torna-se importante ressaltar que quando se fala em tributos (no caso tributos estaduais), estamos tratando dos Impostos (IPVA, ITCMD e ICMS), além das Taxas (DETRAN, SEMA, INDEA e etc.), além de Contribuições (ex. FETHAB).
Ou seja, caso o contribuinte entenda que a exigência de qualquer tributo seja indevida, poderá o mesmo, nos moldes assegurados na Constituição Federal e Código Tributário Nacional, apresentar uma defesa, a fim de que seus argumentos sejam devidamente analisados.
Daí a necessidade de haver uma regulamentação por parte do Estado para tratar da tramitação quanto à análise da aludida defesa, resultando assim, no Processo Administrativo Tributário.
E, conforme alhures mencionado, o Processo Administrativo Tributário resulta na possibilidade de correção de eventuais equívocos cometidos pela autoridade fiscal no tocante a respectiva exigência, sem a necessidade, contudo, do contribuinte ter que assumir despesas, à exemplo de custas processuais (conforme exigido nos processos judiciais).
Por sua vez, gera para o Estado também inequívoca economia, posto que a correção da exigência tributária no âmbito da própria administração evita que o Erário assuma as despesas processuais no âmbito judicial, principalmente no tocante o reembolso das custas judiciais adiantadas pelo contribuinte, bem como honorários advocatícios (os quais com a vigência do novo Código de Processo Civil) tornaram as quantias mais significativas.
Sendo assim, ao analisar o Projeto de Lei apresentado pelo Poder Executivo Estadual, foram vislumbradas algumas inconsistências jurídicas, à exemplo da necessidade de que o processo seja analisado pelo Conselho de Contribuintes (órgão paritário formado por representantes da autoridade fiscal e dos próprios contribuintes) para processos cujo valor seja igual ou superior a 1.000 (mil) Unidades de Padrão Fiscal (hoje no valor de R$ 129,74). Ou seja, de acordo com o Projeto em questão, apenas poderia ser analisado eventual processo no âmbito de tal órgão colegiado de julgamento se o valor da exigência for igual ou superior a R$ 129.740,00!
É certo que há inequívoco cerceamento de defesa, sendo que o Supremo Tribunal Federal já pacificou o entendimento que não pode ser fixado o chamado valor de alçada (valor mínimo) para que o contribuinte possa ter o seu processo analisado pelo referido Colegiado.
Por outro lado, é necessário que a legislação contemple a possibilidade do contribuinte efetivar a sustentação oral perante a análise do processo, a fim de que possa reforçar os argumentos sustentados na defesa, devendo inclusive, ser o interessado previamente notificado da data do julgamento.
Demais a mais, denota-se que o projeto em questão contempla a análise apenas do ICMS. Todavia, já que trata-se de “Lei de Processo Administrativo Tributário”, é certo que a legislação em questão deve contemplar a análise também de todos as espécies tributárias (impostos, taxas e contribuições).
Da mesma forma, à exemplo da legislação que trata dos processos administrativos no âmbito da Receita Federal, deve a legislação garantir a aplicação imediata do entendimento decorrente dos julgamentos definitivos proferidos no âmbito do Tribunais Superiores (STJ e STF), uma vez que não haveria lógica manter a exigência fiscal quando manifestamente contrária ao entendimento do Poder Judiciário.
Do exposto, depreende-se inequívoco de que o processo administrativo fiscal será inválido por alvitamento a garantias constitucionais individuais do cidadão contribuinte se não observar eficazmente quaisquer de suas garantias principiológicas: será inválido o processo fiscal que não observe o direito ao contraditório; será inválido o processo que deixe de assegurar a ampla defesa ao contribuinte e, por fim, será inválido se não for assegurado o princípio do duplo grau de cognição e se deixar de observar o princípio do julgador competente.
Cabe então ao Parlamento Estadual ajustar as inconsistências do aludido Projeto de Lei a fim de que esteja em consonância com a própria Constituição Federal, sob pena de censura do próprio Poder Judiciário se provocado a intervir na presente questão.
*Victor Humberto Maizman é advogado e Consultor Jurídico Tributário, Professor em Direito Tributário, ex-Membro do Conselho de Contribuintes do Estado de Mato Grosso e do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais da Receita Federal/CARF.